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Juventus: Rafael Pinheiro, ex-Santos, explica por que é tão difícil entender o técnico Maurizio Sarri





Fonte da matéria ESPN BRASIL

Nesta sexta-feira, a Juventus recebe o Lyon, às 16h (de Brasília), no Juventus Stadium, pelo jogo de volta das oitavas de final da Uefa Champions League.

E para reverter a derrota por 1 a 0 na partida de ida, sofrida ainda em 26 de fevereiro, a “Velha Senhora” vai precisar mais do que nunca do funcionamento do esquema tático do técnico Maurizio Sarri.

Apesar de ter sido campeão da Serie A, o comandante chega à partida pressionado. A derrota para o Napoli na final da Copa da Itália, somadas às várias apresentações ruins na reta final do Campeonato Italiano, colocaram diversos pontos de interrogação sobre seu trabalho.

Os próprios jogadores alvinegros, inclusive, admitem que tiveram muita dificuldade para entender os esquemas táticos de Sarri.

“Às vezes, lutávamos para interpretar a filosofia do técnico”, disparou o zagueiro Leonardo Bonucci, um dos mais experientes atletas da Juve.

Mas, afinal, por que é tão difícil entender o que Maurizio Sarri quer?

Para entender o método de trabalho do treinador, a ESPN procurou o goleiro brasileiro Rafael Pinheiro, que foi comandado por Sarri no Hellas Verona, na Série C italiana em 2008, quando o técnico ainda estava longe de alcançar a fama.

Segundo o arqueiro, que vestiu a camisa do Santos no início da carreira e hoje está defendendo o Cagliari, o hoje manager da Juventus causou uma ótima primeira impressão com seus treinos, mas não teve o sucesso esperado pela diretoria.

“O Sarri já estava treinando há algum tempo e já dava para ver que era um cara preparado, estudado e que se preocupava com todos os detalhes. A gente treinava bastante e ele filmava muita coisa, mostrava os vídeos para a gente depois. Ninguém fazia isso naquela época, ainda mais na Série C!”, contou.

“Tinha dias que treinávamos dois períodos: de manhã, o time todo, e, de tarde, separado por defesa e ataque. Ele fazia os movimentos coordenados dos atacantes e defensores. Também era algo pouco comum na época”, relatou.

“Enquanto a gente treinava, um auxiliar filmava tudo. Depois, ele editava os lances e, no dia seguinte, mostrava para a gente no vestiário meia hora antes do jogo começar. Mostrava o posicionamento de cada um e campo, era muito detalhista”, recordou.

Sarri esteve à frente do Hellas Verona por seis partidas, mas somou apenas um ponto e foi demitido após cerca de dois meses no comando.

Rafael Pinheiro aponta, porém, que era fácil ver que o técnico teria voos maiores no futuro.

“Infelizmente, não conseguimos fazer os pontos necessários, porque a gente tinha caído da B para a C, e ele não ficou muito tempo conosco. Depois, foi para o Empoli e conseguiu dar o salto para a Serie A, de onde não saiu mais”, apontou.

OS ESQUEMAS

Segundo Rafael, Sarri tem um nível de exigência e cobrança altíssimo, e sempre soube acompanhar a evolução do futebol.

“Ele é um cara ‘chato’, como é o Jorge Jesus, no sentido de que cobra muito. Na minha época, ainda não tinha o lance dos goleiros atuarem com os pés. Mas, anos depois, quando eu o enfrentei no Napoli, deu para ver que até mesmo o goleiro virou uma peça no esquema tático da defesa e no início das jogadas. Dá para ver claramente que ele acompanhou essa evolução”, salientou.

“Na minha época, o que ele mais cobrava dos goleiros era que a gente orientasse e posicionasse a defesa o tempo todo. Ele chamava todos os goleiros para as reuniões do time de defesa e mostrava onde ele queria que os zagueiros estivessem. Como ele fazia muito os laterais virem com a bola na área, ele queria que goleiros, zagueiros e alas se posicionassem sempre de uma forma bem específica. Por isso, a gente fazia muitos treinos táticos, pelo menos uma vez por semana”, lembrou.

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O brasileiro revela que o técnico também é maníaco por jogadas preparadas de bola parada.

“Ele tinha uns esquemas de escanteio e bola parada. Eram umas 10 ou 15 (jogadas diferentes) de cada tipo”, relatou.

“A cada semana, ele chegava com duas ideias diferentes e a gente tinha que memorizar tudo. Aí antes do jogo ele escolhia a jogada número 5, por exemplo, e você tinha que saber! Lateral perto da área tinha também uns quatro movimentos coordenados a serem feitos. E se você olhar os jogos dele, ainda existem isso. Na Juventus ainda não vi tanto, mas o Napoli fazia muito gol de bola parada”, ressaltou.

“Um dia da semana ele estudava uns esquemas de jogadas com a comissão técnica e depois passava para você. Por exemplo, jogadas 1, 2 e 3. Aí, na semana seguinte, eram as jogadas 3, 4 e 5. Você tinha que ter pelo menos uns 20 esquemas na cabeça, desde laterais até faltas perto da área”, revelou.

“Era até movimentos simples. Do esquema 1 para o 2, por exemplo, só variava um zagueiro, que, ao invés de cabecear na 1ª trave, ia para cabecear na 2ª. Mas sempre mudava uma coisa ou outra de acordo com cada esquema”, argumentou.

De acordo com o arqueiro, a especialidade de Sarri é fazer o adversário “jogar errado”.

“Ele é um cara obcecado por futebol. Se você acompanhar um jogo dele com atenção, verá que ele faz o adversário ‘jogar errado’. Por exemplo: os jogadores do time dele já sabem onde vão roubar a bola do rival, e já encurralam o goleiro canhoto a chutar com a perna direita, por exemplo. Dessa forma, a chance dele errar o passe e dar a bola de presente é enorme”, explicou.

“Quando você tem organização, você corre menos, se diverte mais e está sempre com a bola no pé. No Napoli, ele jogou o melhor futebol da Itália e um dos melhores na Europa, por isso todo mundo ficou de olho nele e nos jogadores. Era um time equilibrado e que fazia muitos gols”, rememorou.

“O jogo do Sarri não é exatamente ofensivo. É um jogo que vai te ‘costurando’. Quando ele acha um espaço que você errou, ele te ataca. Na Juventus, ele é um pouco diferente, até pela superioridade do elenco, mas, no Napoli, era sempre assim. Do nada, a bola estava nas costas do lateral que errou na marcação e o atacante estava na cara do gol”, apontou.

“E o que é mais interessante de tudo é que ele nunca foi jogador, pois trabalhava no banco antes de começar no futebol. Mas, por ser um estudioso, começou por baixo e chegou aonde chegou graças aos estudos e às experiências que teve. Não queimou etapas, algo difícil no trabalho de treinador. É um cara dedicado e apaixonado”, elogiou.

RUIM DE VESTIÁRIO?

Após sua passagem pelo Napoli, Maurizio Sarri deu o salto à Premier League, tendo a oportunidade de comandar o Chelsea.

Mas, apesar de ter conquistado a Liga Europa, sua passagem pelos Blues foi considerada um fracasso pela mídia inglesa, principalmente por ele ter sido “engolido” pelos “medalhões” do vestiário.

Fica, então, a questão: seria Sarri um técnico bom de teoria, mas que ainda não sabe como aplicar tudo na prática?

“Eu não sei se ele melhorou um pouco ou piorou em relação ao meu tempo, mas o difícil de jogar com ele é porque ele cobra muito, muito mesmo. Aí você chega num vestiário de maior qualidade, como na Juventus ou no Chelsea, e você precisa ter um pouco de jogo de cintura. Dependendo do jogador que você encontra, ele não está tão a fim de ser cobrado…”, ensinou Rafael.

“É mais ou menos como foi com o Jorge Jesus no Flamengo. No começo, foi difícil para todos, mas depois os jogadores entenderam que, se seguissem o treinador e acreditassem nele, o time iria melhorar muito, como de fato aconteceu. Só faltava a organização para a equipe rodar legal”, comparou.

O brasileiro, inclusive, recorda bem um episódio que ilustra algumas das birras de Sarri.

“Lembrou quando ele chegou no 1º treino dele no Verona. Ele olhou para a gente e falou: ‘Eu dou uma semana para vocês estarem todos de chuteiras pretas. Não quero ver um jogador de chuteira colorida ou branca. Virem-se, não quero saber. Se chegar de chuteira branca ou colorida, nem precisa entra no campo’. Todo mundo achou que ele estava brincando, mas era sério!”, contou.

“O pessoal teve que pedir para os roupeiros pintarem as chuteiras com spray, e quem era patrocinado teve que pedir para as fornecedoras de material mandarem uns pares pretos (risos). Depois de quatro dias, todo mundo estava de chuteira preta, inclusive a comissão técnica e o estafe do clube (risos”, gargalhou.

“E o mais engraçado é que, conforme você ia usando a chuteira, ela ia descascando e mudando de cor (risos). Aí tinha que pintar de novo, senão o homem ficava bravo”, brincou.

O goleiro conta, todavia, que o comandante não é uma pessoa difícil de lidar.

“Ele é um cara clássico, mais à moda antiga, não é muito de papo furado, fala o que precisa ser feito e cobra muito. Não era de dar muita risada ou ser aberto para brincadeiras, mas era apaixonado pelo trabalho e, o principal de tudo: ele fazia você melhorar como jogador. Se você quisesse, é claro”, explicou.

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“É uma pessoa simples, humilde, trabalhadora e apaixonada por futebol. Ele não dorme enquanto não estiver satisfeito com o trabalho, não descansa. É obcecado por ganhar jogos e ensinar o que acredita aos outros, independentemente se dará certo ou errado. Ele é realmente um ‘professor’ de futebol”, afirmou.

Rafael, aliás, tem ótima relação com o ex-chefe até hoje.

“A última vez que o vi pessoalmente e conversei com ele foi na final da Liga Europa, entre Chelsea e Arsenal, em Baku. Depois do jogo, o pessoal saiu para jantar e eu fui junto. Ele me viu e brincou: ‘Rafa, o que você veio fazer aqui?’, e eu disse que tinha ido ao jogo porque sou praticamente um irmão do Jorginho. Ele riu e disse que estava brincando. Eu dei os parabéns pelo título, ele estava muito feliz. Foi o Sarri, inclusive, que veio me cumprimentar, pois eu estava escondido no meu canto. Mas ele é sempre assim, um cara muito simples e educado, não esquece as origens”, disse.

Outras características marcantes de Sarri são sua insônia (as olheiras fundas são provas disso) e a obsessão por cigarro.

“Como a gente jogava a Série C, não tinha essa encheção que tem hoje com ele por fumar. Ele fumava o tempo todo, tanto nos treinos quanto nos jogos. Às vezes, ele deixava até o auxiliar dando treino para fumar um pouco afastado”, recordou.

JOGADORES SISTEMÁTICOS

Rafael aponta que Sarri, apesar de meio maluco, também é um bom motivador.

“Ele é ótimo orador, pois é muito culto. Antes das partidas, ele colocava sempre as três coisas que o time precisava fazer para sair vencedor, e as outras três coisas que não poderia fazer, senão o time adversário iria punir. E praticamente sempre ele acertava”, exaltou.

“Ele tinha tanta informação sobre o adversário que era um negócio incrível. Por isso, ele deixava o jogador sem qualquer dúvida do que precisava fazer em campo. Mas também deixava claro que, se você não fizesse o que ele tinha pedido, ele ia te cobrar”, relatou.

O brasileiro aponta, inclusive, que há jogadores que entendem melhor as ideias de Sarri do que os outros. E é por isso que ele gosta de levar esses atletas para os clubes que comanda, já que entende que isso é um “atalho” para a equipe se adaptar ao seu futebol. Um caso emblemático é o do volante Jorginho, que foi levado do Napoli para o Chelsea.

“O jogo do Sarri é uma quebra-cabeças. Funciona assim: se o meio-campo não faz, o zagueiro não consegue fazer. É uma roda. Se o atacante não fecha o lado, o lateral não consegue chegar e a bola passa. E, se os caras fizeram uma tabela, eles chegam na cara do gol”, ressaltou.

“Por isso ele tem os ‘jogadores sistemáticos’ dele. Alguns jogadores que ele levou ao Napoli foram caras comandados por ele no Empoli, porque o jogo dele é tão específico que ele precisa desses caras certos, senão demora muito para os atletas assimilarem as ideias dele. Tanto é que, neste ano, na Juventus, ele sofreu muito para colocar o padrão dele. O time todo precisou se adaptar”, observou.

“No Chelsea, ele levou o Jorginho, que era a peça-chave dele no Napoli e virou também em Londres. Como o Sarri é muito tático, ele precisa de uns caras para ajudar na adaptação e para ensinar os outros jogadores. Tem jogador que não consegue assimilar nunca, mas o atelta moderno consegue e rende bem no time dele”, argumentou.

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